Bastava olhar-te para as mãos para me consciencializar de que o tempo é um cavalo sem freio. Antes macias, seguras. Agora enrugadas e trémulas. Depois vinha o aperto no peito. A sensação de que não conseguiria viver sem ti, sem essas mãos que operaram milagres por mais de seis décadas. As mãos que me convenceram a dar de mim, as mesmas que agarraram nas minhas, pedindo-me que fossem suas. As mãos que acariciaram as minhas três barrigas proeminentes, que mais tarde agarraram em cada um dos bebés que daí nasceram. Bastava-me olhar para elas para começar a arfar. O medo de perder o companheiro de sempre seguindo-se as rezas para que Deus me levasse antes de assistir ao teu último suspiro ou que, melhor ainda, a morte fosse um último acto simultâneo: um «morreram» ao invés de um «morreu».
Bastava-me ouvir os três bebés, que estranhamente viraram homens, no canto do quarto, sussurrando, para acentuar o ritmo das rezas. Não me voltava para eles, não. O meu olhar não se desviaria nem por um segundo dos teus, que de um modo inexplicável não me imploravam para ficar. Antes transmitiam a calma e a segurança que, outrora, encontrei nas mãos que te falo. Agora enrugadas e trémulas, acentuando a tristeza que sentia de teres desistido antes de mim. Acentuando a certeza da velhice.
Mas não faz mal, não te apoquentes. Não agora, companheiro de uma vida. É que ao longo dos anos, aprendi a rezar por dois.
Bastava-me ouvir os três bebés, que estranhamente viraram homens, no canto do quarto, sussurrando, para acentuar o ritmo das rezas. Não me voltava para eles, não. O meu olhar não se desviaria nem por um segundo dos teus, que de um modo inexplicável não me imploravam para ficar. Antes transmitiam a calma e a segurança que, outrora, encontrei nas mãos que te falo. Agora enrugadas e trémulas, acentuando a tristeza que sentia de teres desistido antes de mim. Acentuando a certeza da velhice.
Mas não faz mal, não te apoquentes. Não agora, companheiro de uma vida. É que ao longo dos anos, aprendi a rezar por dois.
Caracóis fabricam letras.
10 comentários:
Este é um fim de amor que ninguém quer viver mas que muitos vivem. Uma descrição perfeita de uma vida repleta de amor.
Estas histórias de amor e saudade, que de verdade têm muito, deixam-me sempre com um nó na garganta. Consola-me saber que tal como este casal, e muitos outros, quando olho para trás do meu ainda precário caminho percorrido, sinto que este foi vivido intensamente e sempre de acordo com as minhas escolhas. Serão essas as minhas recordações um dia.
Beijinho :)
Obrigada pelos vossos comentários! De facto, foi nisso que me pensei quando escrevi o texto. Às vezes temos tanto medo de perder alguém... mas mesmo na melhor das hipóteses (conseguir um companheiro de vida) esse dia é inevitável. =(
Lindíssima história <3 **
Belo tema, belas palavras. Muita inspiração porque é tão bom "ler-te".
Beijinhos para ti e para o Um :)
Mesmo inevitável.
Emocionante e lindo,embora triste por ser verdade para tantos...beijos,chica
Linda historia e adoro a foto.
História escrita com muita sensibilidade. A sua leitura toca fundo, embora saibamos da inevitabilidade da vida...
Gostei muito do final.
Bjs deste também operário da Fábrica de Letras. Virei a esta casa mais vezes.
Obrigada mais uma vez!
Fico contente por gostarem e mais contente fico se voltarem! =D
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