terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

(Sem título)

Olhou para as cinco letras que, à semelhança do que o X faz num mapa de tesouro, indicavam que era ali que te encontrava. Fixou-as no visor. Pela primeira vez, apeteceu-lhe carregar no verde. Telefonar-te.
E foi então que se apercebeu. Mentira-te. Desculpa-a, não foi propositado. Mas mentira-te. Estava viciada naquela adrenalina que só a fugacidade dos actos proporciona e quis que assim o fossem para sempre. Breves.
Meses depois, recordava-se do pronome. Vocês.


Naquela noite.
Trazia nela o desejo frágil, aquele que se desmancha logo após o corpo. A mão na cara. A tua mão, descarada, na cara dela. A reflexão breve da estranheza da erogenia. E a meiguice, num aperto tardio, já depois de consolados:
- Sabes que nada dura para sempre - Não lhe perguntaste. Não lançaste um debate. Uma afirmação. Simples. Palavras duras para um coração ainda mais duro. Petrificado. Pelo medo.
Nada dura para sempre. Pensou. Nada dura para sempre. Riu-se dele. Ela também o sabia. Não se afastou. Não se aconchegou. Deixou-se ficar. A mão na cara. A tua mão, agora doce, na cara dela.
- Nem a dor - Terminaste. Sem hipótese de debate. Uma conclusão. Simples. Palavras sábias para um coração instantaneamente menos duro (mole?).

Hoje.
Ela acreditou finalmente no que contaste (tu já sabias). Foi procurar-te. Ali mesmo, no visor. Cinco letras e uma segunda vez. Menos breve. Muito menos breve. E mais dela. Muito mais dela.

(Prometo)

2 comentários:

AP disse...

A escolha da imagem não poderia ser mais apropriada. Adorei!
Quanto ao texto, só tenho a dizer que é arrebatador. Arrebatador!

Underground disse...

A sedução da incerteza, do desafio, do impossível. A vontade de se enganar a consciência, de se trocar as voltas à verdade. Saber que pode ser assim, mas se calhar vai ser diferente... O fim é sempre o mesmo. Um foi assim. E nós sempre soubemos que seria.